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Post: POPULAÇÃO NÃO ENTENDE LIBERAÇÃO DA DROGA PARA USO PRÓPRIO, DIZ PSIQUIATRA

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A população brasileira não está pronta para entender a descriminalização do uso de drogas, segundo a psiquiatra e presidente da Abead (Associação Brasileira de Estudos do Álcool e outras Drogas) Ana Cecilia Marques.

Para ela, a medida só seria possível acompanhada de uma política de prevenção, tratamento e informação que o Brasil não tem atualmente.

O julgamento na descriminalização, no STF (Supremo Tribunal Federal), voltou a ser suspenso nesta quinta depois que o ministro Luiz Edson Fachin pediu vista do processo para analisar com mais profundidade o caso. Não há data para que a discussão seja retomada.

Folha – Você é contra ou a favor da descriminalização do porte de drogas para uso pessoal?
Ana Cecilia Marques – Sou contra dessa forma que ela está sendo feita. No meu ponto de vista, a população inteira vai estar submetida a vários equívocos. O primeiro deles é pensar que tudo foi liberado. Ninguém vai entender que é só o porte. Toda a reflexão que temos que fazer, de que a droga é ilícita, a população não está preparada para entender esse tipo de ação. E a repercussão vai gerar uma cascata problemas.

Nos países desenvolvidos que já flexibilizaram essas leis, você tem o relato do impacto que isso causou. Aumento do consumo, principalmente entre adolescentes, aumento de dependência da cannabis, exposição muito mais fácil para consumir outras drogas. Problemas de humor, depressão, crise de irritabilidade, e isso no indivíduo que não é dependente ainda. Basta vermos o que acontece com quem bebe álcool. A gente não tem uma política completa de drogas para dar conta disso, nem das drogas ilícitas nem das lícitas.

Quando falamos de drogas, estamos falando de algo que é visto pelo mercado como um produto qualquer, e não é. É uma droga psicotrópica, que altera o cérebro. Se vira um produto qualquer, se nós já tínhamos traficantes, vamos continuar tendo e, além disso, uma economia das drogas vai ser criada. Vamos ficar na mão da indústria, como ficamos na mão da indústria do álcool. Quem dita a política do álcool no país? A Ambev. Então não é verdade que não vamos ter problemas se tivermos uma legalização, que é o passo seguinte. A gente está falando do porte para consumo individual, mas onde o indivíduo vai comprar? Então vai ter que plantar. Se vai ter que plantar, uma empresa que plante, colha e faça o cigarro vai ter que ser criada. De novo vamos estar nas mãos de uma indústria que dança conforme o mercado.

E quanto aos argumentos de que o uso das drogas não afeta os terceiros?
Onde está escrita essa história que droga é um problema individual, em que livro? A droga é um fenômeno humano que atinge o indivíduo e toda a sociedade. O indivíduo que usa a droga perde a autonomia, porque ela atinge a área do cérebro responsável por ela, que é o córtex pré-frontal. Ele não controla a quantidade que usa, não controla os atos e muito menos as consequências, que não atingem só a ele. Todos os argumentos, para mim, são furados.

Não vejo esse ato como um avanço, muito pelo contrário. É um retrocesso. Eu acho que a política atual não funciona, mas se todos os atores se reunissem, acho que a gente teria uma saída mais humana, mais justa, mais de acordo com a realidade brasileira.

Se a gente olhar só para essa questão, que é a retirada desse artigo da lei, isso é reduzir o problema a pó, como se ele fosse simples. E toda ação simples para um problema complexo, para mim, é um desastre.

Qual impacto a descriminalização teria na área da saúde?
Eu vejo como um desastre. As pessoas vão usar mais, vão pirar mais e não tem serviço de saúde que dê conta disso. Para a saúde vai ser horrível. A emergência não vai dar conta dos quadros de intoxicação e os centros de tratamento não vão dar conta do número de dependentes porque já não dão. Não teremos leitos para desintoxicar casos mais graves.

Você acha que no futuro essa descriminalização pode ter espaço para acontecer?
Se tivermos uma política integral que faça prevenção, que informe a população, que controle o produto e que disponibilize tratamento adequado, por que não? Se a população estivesse submetida essa política, a medida talvez se encaixasse dentro de um processo. Como não está, eu acho que o impacto vai ser desastroso.

Fonte: Jornal Folha de S. Paulo

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